2.09.2015



a semana começa muito antes de pousar as duas mãos cobre o volante. a semana começa na noite anterior, no processo de preparação da roupa para o dia seguinte, e a roupa é só uma metáfora. pensamos a roupa como se começassemos a vestir a semana. é o Domingo à noitinha que marca o princípio de mais um ciclo de 7 dias mas esta semana só começou verdadeiramente hoje, quando, de manhã, pousei as mão no volante e liguei o rádio.
porque às vezes os inícios são mais fáceis se for a dançar.

mama they call her bad girl
all because she wanted to be free

2.01.2015


 


tinhas na pele todos os desencantos da vida. carregavas demasiada poesia, toda ela escrita em sítios onde te perdeste. andas, portanto, a carregar palavras erradas.


:: nota sobre uma manhã de chuva

nesta passagem pela época fria do ano tem dias em que devia ser lei enrolarmo-nos na madrugada dos lençóis a ouvir o barulho das coisas lá fora a começar. primeiro os pássaros no jardim [a descobreta que também há pássaros no Inverno], depois o chuveiro na casa do lado e finalmente os objetos que teimam em cair ao chão a horas desadequadas lá no 1º esquerdo. só depois os carros e a gente e a energia desadequada das vozes dos senhores da obra mesmo à frente da porta.

estes são os intervalos da vida de todos os dias. não trazem mais conhecimento ou especial lucidez, mas talvez sirvam para pôr o tempo em perspectiva. o tempo, essa ferida menor.

pedimos para que voltem as horas grandes e o clima ameno para que consigamos outra vez meter nos dias tudo aquilo que temos pendente. mas o tempo é preciso devagar, sem pressas. deixá-lo fazer o seu trabalho numa manhã de chuva é arte que esta geração não conhece.

depois queixam-se.

1.28.2015

:: road trip

a não ser o mundo por descobrir, que já não é coisa pouca, éramos nós, um carro e pouco mais. dificilmente teria havido melhor viagem para se fazer a dois.
o conforto extremo do embalo do carro não podia ter sido melhor companheiro de viagem e testemunha de uma aprendizagem. nem o desconforto inicial dos silêncios nos amedrontou. logo surgia uma certa paisagem interrompida pelo vento na cara, a surpresa de encontrar as pessoas tão longe nas suas vidas, e de novo o barulho da estrada, tudo isto abafa os silêncios menos cómodos. tudo isso tem um nome - é a excitação da arrebatadora liberdade do viajante.
foi o Thunderbird descapotável de Thelma e Louise que colocou no meu imaginário a aventura de uma road trip. difícil não desejar que aquele tempo de descoberta regresse. e ainda hoje escutámos a tal balada na rádio que nos acompanhou durante os 15 dias que durou essa aprendizagem.

hoje, na madrugada, a ouvir o barulho das coisas a começar, já quase não lembro os desconfortos, as dificuldades, tudo aquilo que se estranhou. lembro as gargalhadas e os acordes da canção que deram o mote à viagem.

È il tempo per ballare
Oppure di andare
Alla zona balneare
Lo meriti vai
Vai vai vai vai va



1.27.2015

:: divórcio

a vida muda
as coisas mudam.
mais que não seja é a gente que muda. 
 
vou-nos desenlaçando devagar nas memórias enquando escavo por aquilo que já fomos. vou-te esquecendo nos gestos que deixaste de ter, nas palavras que são cada vez mais escassas, até nas linhas de um postal antigo. lembro-me que não há muito tempo escrevíamos um ao outro...
há ainda duas mantas na sala e penso em dizer adeus. penso que um dia teremos oportunidade de dizer todos os adeus, é possível até que nos choremos, é possível que, no fim, façamos juras de amor eterno. mas acabará sempre por ficar apenas uma manta na sala.
esta maldita liberdade que nos prende debaixo da ilusão de que podemos tudo eternamente, estejamos nos 20, nos 40, nos 60. no fim acabamos com nada. não deixamos de ser uma apanhado de pequenas histórias insignificantes. 
decido partir. convenço-me que é por falta de opção. lá fora o dia segue passando, um casaco parece-me bem.
 
 

lafilleblanc:

Anna Paola Guerra

12.26.2014

:: para além daquele amor excessivo, o que nos resta?

sim, o amor também é isto - um leve tocar de pés debaixo da manta no sofá, em frente à TV.
é preciso deixar entrar a normalidade apesar de todos os medos, senão era só desejo. nem que isso implique aceitar os perigos desse monstro - a normalidade - e saborear apenas uma noite fria debaixo da manta no sofá.
é até aconselhável ceder interrupções ao amor explosivo porque amar assim, cansa. não tem espaço para os outros, para o trabalho, para nós próprios. esse amor subsiste na cama, alimenta-se de beijos e sexo e respira pelas narinas do outro, sua pelos poros do outro.
vamos lá então deixar cair a normalidade, aceitar uma ou outra certeza, mas não nos esqueçamos como nos apaixonámos ali, no átrio daquela igreja, em cinco segundos.

bem sei que não controlamos nada, 
nem o amor, nem nós próprios por isso, olha... pega a minha mão e leva-me.