3.20.2010

hoje já me lembrei daquela fotografia tirada no final do ano em que nos conhecemos, o primeiro de todos os que passámos juntos. 

depois de me baptizares, sentaste-me ao teu colo ao volante do carro, eu sorria para a câmara divertida, tu olhavas para mim. e a fotografia captou tudo, mas tudo, o que se passava nesse olhar. 

nunca me disseste que gostavas que tivesse acontecido um rapaz na tua vida, mas eu sei que sim. teria facilitado tanta coisa, tantas conversas que não soubemos ter, tantas distâncias que podiam ter sido evitadas.

atrás daquela fotografia, a primeira desse olhar, vem a recordação das tardes intermináveis de praia, os nossos momentos, só nossos, fora de pé e o rigor com que me ensinaste a nadar. o rigor. contigo não aprendi só a nadar. aprendi na primeira pessoa que uma criança é uma criança, não é um adulto, e que o lugar das crianças é na cama às 20.00; que as crianças jantam antes dos adultos; que não há televisão à noite, nem espaço para quebrar regras. disseste-me uma vez por cima do meu choro que quando se quebra uma, se abre um precedente para quebrar muitas mais e isso é muito perigoso porque há regras bastantes mais determinantes na vida de alguém do que a proibição de partilhar o sofá com os mais velhos para ver a Bota Botilde. foi preciso que passassem alguns anos para perceber que querias ensinar-me o meu lugar no mundo, o que me deixa alguma esperança que o tempo me ajude a compreender tudo o que ainda não entendo. reconheço, pelo menos, a enorme sorte de te ter cá para nos podermos aprender sem urgências.

nunca me disseste que gostavas que tivesse acontecido um rapaz na tua vida, e eu nunca te admiti a ti que também desejei ser homem quando deixámos de saber falar sobre as coisas mais importantes. e tenho mais isto para te dizer: um dia quero ensinar o meu filho a nadar fora de pé. como tu. 

ainda vou a tempo. não vou, pai? 

1 comentário:

Anónimo disse...

Quando queremos mesmo, há sempre tempo para mudar as coisas, corrigir o errado, dizer o não dito ou reviver o especial. Mas apesar das regras "invioláveis" e do secreto desejo de um rapaz, ele ama-te... tanto ou possivelmente até mais que ao filho que nunca teve. Se calhar à sua maneira, de uma forma única, especial.